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Cientistas da Unicamp mapeiam desinformação sobre Covid-19

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O ano de 2020 deu nova prova de que o combate a pandemias é tarefa complexa, que exige rigor e seriedade na implantação de políticas, além de avanços científicos. Ainda que falar em epidemia remeta imediatamente ao novo coronavírus e suas mais de 1 milhão de vítimas fatais, a ciência se debruça também sobre outro “vírus” de propagação rápida e efeitos catastróficos: a desinformação.

As fake news influenciam assuntos essenciais da humanidade, como saúde e as eleições, mas qual a motivação e quem está por trás da criação? Pesquisadores da Universidade de Campinas (Unicamp) que vivenciam os efeitos das notícias falsas na ciência e no cotidiano têm buscado, assim como outros tantos ao redor do mundo, unir forças para alcançar as explicações e medidas de combate. O trabalho é interdisciplinar e tem vasto material de estudo – o que mostra a complexidade do problema.

Professor do Departamento de Física Aplicada do Instituto Gleb Wataghin (IFGW), da Unicamp, Leandro Tessler é um dos membros do Grupo de Estudos da Desinformação em Redes Sociais (EDReS). “A importância do grupo é mobilizar gente na Unicamp e fora dela para estudar de uma forma acadêmica e tão objetiva quanto possível o fenômeno da difusão de noticias falsas em redes sociais”.

“Hoje em dia se fala em uma pandemia de desinformação, porque ela se propaga de forma muito parecida com uma epidemia. Todas essas fake news que aparecem têm um pico de divulgação, depois diminui como o número de infectados”.

Uma das frentes de atuação dos pesquisadores é o mapeamento de desinformação que circula no WhatsApp sobre a pandemia do novo coronavírus. Para isso, criaram uma linha de denúncia que já recebeu cerca de 60 mil mensagens (leia mais abaixo).

A professora do Departamento de Política Científica e Tecnológica (DPCT) Instituto de Geociências (IG) da Unicamp Leda Gitahy, outra colaboradora do grupo de estudos, conceitua a cadeia de desinformação como uma atividade proposital e articulada.

“O que a gente chama de desinformação é aquela intencional e organizada, mal intencionada mesmo. (…) É feito como marketing e é adaptado para diferentes realidades, para diferentes sotaques [e idiomas]”, afirma Gitahy.

A professora explica ainda que a desinformação não inclui somente notícias falsas, pois existem conteúdos verdadeiros que são retirados de contexto (frases ou trechos de entrevistas usados de forma isolada) ou compartilhados depois de uma mudança de cenário.

Um exemplo são mensagens que afirmam que Israel havia adotado apenas isolamento de idosos para combater a pandemia, o que foi assunto do #FATO ou #FAKE, plataforma de checagem do G1. As mensagens falsas usavam números e afirmações desatualizadas sobre o coronavírus no país.

Tessler acrescenta que a “versão” das fake news no campo da ciência, descrito como pseudociência, também circula nas redes e alimenta a desinformação.

“Você tem uma série de atividades humanas que se transvestem de ciência, quer dizer, vestem a roupa da ciência sem seguir os cânones científicos. (…) Esse tipo de atividade pseudocientífica vem acontecendo há muito tempo, por isso eu me interessei sobre a divulgação cientifica como um possível caminho para mitigar esse efeito”.

Professor do Departamento de Física Aplicada, Leandro Tessler: 'hoje se fala em uma pandemia de desinformação, porque ela se propaga de forma muito parecida com uma epidemia' — Foto: Antonio Scarpinetti/Unicamp

Professor do Departamento de Física Aplicada, Leandro Tessler: ‘hoje se fala em uma pandemia de desinformação, porque ela se propaga de forma muito parecida com uma epidemia’ — Foto: Antonio Scarpinetti/Unicamp

60 mil mensagens em canal de denúncia

O canal de denúncias via WhatsApp foi aberto em março. De lá para cá, cerca de 60 mil mensagens já chegaram. O objetivo é classificar os conteúdos de desinformação em “famílias” para encontrar padrões e motivações em comum. Para o trabalho de filtragem, os pesquisadores utilizaram inteligência artificial.

As 30 mil mensagens aproveitadas até agora — já que parte não tem conteúdo falso e outra parcela sequer é mensagem informativa — foram distribuídas em 14 a 18 famílias. Um deles aborda tratamentos milagrosos (desde receitas caseiras até uso de remédio sem comprovação científica, como a cloroquina e ivermectina). Outro tem como narrativa a afirmação de que o vírus foi criado pela China, e um terceiro ataca o uso de máscaras.

Gitahy acrescenta que as narrativas se adaptaram ao longo da pandemia. No começo, os conteúdos comparavam a Covid-19 a doenças menos letais e até a negavam. Depois, o foco mudou para tratamentos sem comprovação e ataques às medidas de combate, como uso de máscaras.

O trabalho está em andamento, mas uma análise preliminar já identifica que as fake news têm como linha de condução a tentativa de diminuir a gravidade da Covid-19.

“Elas [conteúdos falsos] podem até não ter sido propositalmente colocadas junto, mas o conjunto dessas fake news, a ideia é que elas criem uma sensação nas pessoas de segurança em relação a pandemia”, afirma Tessler

“Ou seja, é sempre na direção de minimizar a gravidade da pandemia e isso está alinhado a um discurso político que nós conhecemos muito bem aqui no Brasil”, completa o professor.

Ciência mal feita usada para desinformar

pseudociência tem como uma de suas origens o uso de artigos pre-print (pré-publicados), mantidos em repositórios para passarem por revisão de pares, mas que acabam reprovados porque os autores deixam de cumprir critérios necessários e mínimos. Apesar da não aprovação, parte destes textos são usados como base para teorias sem comprovação que são difundidas nas redes sociais.

“São pessoas que escrevem artigos que têm cara de artigo cientifico, referências como os artigos científicos, estão em um repositório que tem o logo de instituições científicas, mas ele não passou pelo processo de validação cientifica que a sociedade aceita, que é o que se chama de validação por pares em revistas”.

Na área em que Tessler atua, a divulgação de pseudociência pode “afetar a percepção que as pessoas têm do mundo”, afirma o pesquisador. Ele compara a propagação de uma pseudociência a epidemias, que avançam de forma descontrolada e têm picos ante de desacelerar.

A revisão das pesquisas é um mecanismo da ciência para evitar a publicação em revistas de artigos com falhas. “A revista recebe um artigo para publicação, o editor decide se ele é relevante para a revista e envia para dois ou três revisores. Então a função do revisor é ler o artigo, tomar cuidado para ver se as referencias estão corretas, se as ideias fazem sentido, e muitas vezes você fala ‘não, essas ideias não correspondem aos fatos. Esse artigo não deve ser publicado’.”

“Pessoas com outros interesses vêm tratando disso como se fossem evidências científicas. Ciência mal feita, artigos mal escritos, como se tivessem evidência para coisas que não têm.

Da fusão fria à cloroquina

Um dos exemplos citados por Tessler é o caso de um estudo sobre fusão fria do fim da década de 1980 em uma universidade de Provo, cidade do estado norte-americano de Utah. Um grupo de cientistas divulgou que havia conseguido alcançar a fórmula de fusão nuclear em temperatura ambiente.

Segundo Tessler, a descoberta prometia ser inovadora, já que reproduzia a reação química que ocorre no sol e gera a fonte de energia que permite a vida terrestre. “Isso seria muito importante, porque se fosse correto, a gente teria uma fonte de energia barata, segura, limpa e simples. Ou seja, muito dos problemas da humanidade estariam resolvidos”.

No entanto, o que ocorreu foi um erro no laboratório que os cientistas não se deram conta. “Eles chamaram uma coletiva de imprensa antes do artigo ser publicado, muita gente da comunidade científica torceu o nariz e logo se entendeu o que eles tinham errado”.

Só que o grupo de cientistas havia ido longe demais para voltar atrás, pois a pesquisa já tinha sido difundida. Eles mantiveram a narrativa de que o estudo tinha validade, mesmo com os erros apontados.

“Isso virou piada, depois de um ano ninguém mais falava disso, mas teve um grupo de pessoas que acreditava neles e até hoje, 30 anos, tem o congresso da área de fusão fria e levam a sério qualquer evidenciazinha, por mais fraca que ela seja”.

Fato parecido ocorreu com o médico francês Didier Raoult, difusor do uso da cloroquina para Covid-19, o que ainda não tem nenhuma confirmação científica, reforça o pesquisador da Unicamp.

“Ele chegou em um ponto que não pode mais voltar atrás. O presidente da França visitou o laboratório dele. Ele insistia que a cloroquina salvava. Ele realmente passou pela revisão por pares, mas com conflitos de interesses. Como ele é chefe de uma equipe muito grande, editores de revista trabalham para ele (…) e isso virou evidencia até hoje, quem defende cloroquina como tratamento para Covid-19 usa os artigos”.

‘Ciência responde como pode’

Tessler ressalta a importância da união de forças de várias áreas da ciência para combater a desinformação, inimigo que se evoluiu rápido e encontrou nas redes sociais uma força propulsora alarmante.

“A ciência responde como ela consegue, e o resultado não tem sido muito bom. O problema é que, eu conheço bem o caso aqui do Brasil, a maior parte dos divulgadores [de trabalhos científicos] — isso está mudando, ainda bem — mas muita gente entende que o problema é a educação cientifica das pessoas. E o problema na verdade não é esse.”

“Não basta educar as pessoas, o problema é que existem identidades de grupo em que as pessoas acreditam em ideias pseudocientíficas porque isso faz com que elas pertençam a um grupo”.

O caminho que o professor da Unicamp indica é o de tentar quebrar, por meio do diálogo com argumentos científicos, as bolhas que se formam nas redes sociais. “O mais importante hoje para a ciência é criar canais de comunicação com as bolhas que recusam a ciência”.

Fonte: G1 Sul de Minas

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